2010/01/11

Oração

Hoje apenas quero partilhar com vocês algumas ideias que me foram surgindo ao longo destas últimas semanas, fruto de coisas que li e conversas que fui tendo. Se falar em coisas que já vos sejam bastante óbvios, peço desculpa; para mim é novidade.
A oração deve-nos unir a Deus; deve evoluir à medida que vamos crescendo em intimidade com Deus: de vocal para meditação para, finalmente, contemplação. Até aqui, nada de novo. Acontece que eu tinha ideia que esta última - meditação - era só para alguns, que estava reservado para os grandes místicos e contemplativos religiosos e que, portanto, não era para os demais. Era quase como que uma espécie de oração "opcional". E no entanto tenho vindo a compreender que é algo que não é só para alguns, mas para todos, independentemente do estado de vida. O chamamento que Deus nos faz, o convite para intimidade com Ele, passa necessariamente pela oração contemplativa. Fico com ideia que isto não é percebido pela maior parte das pessoas, e que associado a este desentendimento (se origem ou consequência, não sei, mas creio estarem correlacionados) está a diminuta presença de religiosos contemplativos no Ocidente.
Tendo em conta que considerava a contemplação algo "opcional", para mim toda a oração deveria ser expressa ou através de palavras, ou então de actos exteriores, ou então de uma mistura dos dois. Aprendi a rezar com a minha avó; lembro-me de ter dois anos e pouco e ela sentar-se comigo na cozinha ao pé da sua imagem de Nossa Senhora e dizer-me para repetir as Avé Marias e Pai Nossos que ela ia dizendo. Durante muitos anos isso era o que eu entendia como oração: oração vocal. Até mesmo depois de voltar a ter fé, a minha oração passava na generalidade por oração vocal embora tivesse consciência de que deveria ter uma componente de diálogo. Que se deveria ir simplificando, disso sabia, mas pensava que isso quisesse dizer menos palavras, menos ideias dispersas, petições do tipo "menos minha vontade, mais Vossa vontade", etc. Mas que um progressivo reconhecimento da presença de Deus no dia-a-dia fosse oração, não sabia; que os acontecimentos rotineiros da vida remetessem automaticamente para oração, desconhecia. Sussurros do divino nas coisas mais simples da nossa vida, e eu desconhecia-o. Mas mais ainda, desconhecia que as palavras deveriam acabar por desaparecer por completo. Que a oração se deveria tornar num único acto, que esse acto fosse algo holístico... Longe de mim, meu Deus, longe de mim! Como poderia eu algum dia conceber tal coisa? Para mim isso seria uma distracção no meio da oração, algo que eu procuraria calar, e no entanto não deverá a oração no final ser Vós a falar e nós a escutar?
De certa modo estes casos são o princípio de uma oração "profunda", de uma experiência mística cristã, mas que ao mesmo tempo não deixam fazer parte da experiência humana, algo "natural". Falei em tempos em ser preciso (re-)descobrir o sentido de Maravilha e ocorreu-me agora que talvez isto esteja relacionado com esse assunto. Creio que muitos de nós experimentámos estas formas de oração tão subtis, mas acabamos por não lhes dar a devida importância por não as reconhecer como tal. Ou talvez já o saibam e eu é que venho apanhar o comboio já com algum atraso. Perdoem-me se generalizo demasiado.
Gloria a Deus por todas as coisas!

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